UMBRASIL: Como o Plano Nacional de Educação (PNE) 2011-2020 pode contribuir para melhorar a qualidade da Educação no Brasil? E, que benefícios ele vai trazer para a educação do país quando for sancionado?
ANGELO VANHONI: O Plano Nacional de Educação está estruturado com doze artigos que estabelecem os princípios gerais da educação em todo território brasileiro e composto de vinte metas e inúmeras estratégias. Essas vinte metas estão basicamente centradas em dois eixos. Primeiro, a garantia de acesso à educação de qualidade a toda criança em idade escolar, consideramos as crianças com idade de zero a três anos, de quatro a seis, até os 17 anos – ao término do ciclo básico, ensino superior, pós-graduação e doutorado -, indistintamente, independentemente da raça, condição social e religião. O eixo do Plano Nacional que norteia as vinte metas garante a inclusão de todos os brasileiros em idade escolar no sistema educacional brasileiro. Para isso precisa elencar estratégias para os gestores municipais, estaduais e nacionais, cumprirem esta demanda nacional. No país temos perto de 11 milhões de crianças, de zero a três anos, sem cobertura de creche. O Brasil precisa se preparar e se mobilizar do ponto de vista financeiro e de recursos humanos para incorporar essas crianças também na educação.
Outro eixo é o da qualidade. Precisamos de educação de qualidade para consolidar uma nação democrática, que traga desenvolvimento econômico e humano para os brasileiros. Educação de qualidade significa grande investimento por parte dos entes da federação no que diz respeito à formação continuada dos professores, da construção do conhecimento, do acompanhamento das novas tecnologias na área da aprendizagem e na valorização do magistério. O Plano Nacional estabelece um conjunto de metas, que se forem implantadas e consorciadas entre os municípios, os estados e a união no decênio de vigência do Plano, eu não tenho dúvida, a educação brasileira será outra.
UMBRASIL: O PNE 2011-2020 ainda encontra-se em tramitação no Congresso Nacional. Qual o impacto que esta demora na aprovação vai trazer para a sociedade brasileira?
ANGELO VANHONI: O Plano Nacional está em tramitação na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal. Depois deverá ser aprovado pela Comissão de Justiça do Senado e a última Comissão é a de Educação e Cultura. Esperamos que até o final desse semestre, começo do outro, o Senado tenha se pronunciado. A demora, na minha avaliação, é um prejuízo muito grande para o Brasil, não ter um Plano Nacional de Educação, com um conjunto de metas apreciadas pelo congresso nacional, sancionadas pelo poder executivo, que estabelecem diretrizes para fazer com que a educação avance em todo território nacional.
Para os municípios e estados o prejuízo é maior. Não vamos ter um plano municipal e estadual enquanto não definirmos a lei maior, que é o Plano Nacional de Educação em votação no Congresso Nacional. Isso traz um atraso muito grande para que o planejamento estratégico das secretarias municipais de educação e dos diversos setores envolvidos no processo educacional possam se debruçar em relação às metas a serem atingidas em cada município e em cada estado, que têm diferenças regionais muito grandes em todo o território nacional.
UMBRASIL: O PL 8035/2010 do PNE 2011-2020 alcançou recorde de propostas de emendas (2.915) e a análise destas durou quase um ano. Qual foi o maior desafio, como relator, nesse processo?
ANGELO VANHONI: O maior desafio se deu sempre na questão econômica, porque o plano na sua concepção tem audácia. O Brasil está precisando dessa atitude audaciosa em relação à educação. Audácia com possibilidade de realização. Por isso a meta 20, que garante os recursos para realização do conjunto dessas metas, demandou maior número de discussões, foi o processo mais intenso do debate, tanto dentro da Câmara (dos Deputados) como também em relação aos movimentos sociais e ao poder executivo. O final satisfatório, aprovada por unanimidade a proposta de 10% que, no meu entendimento, é suficiente para atender as demandas educacionais do Brasil pelos próximos dez anos.
UMBRASIL: A Câmara aprovou 10% do Produto Interno Bruto (PIB) na Educação pública. Além de comemorar, é preciso pensar em formas eficientes para a aplicação desses recursos. Como esses recursos podem ser utilizados para que de fato possibilitem melhorias na Educação Nacional?
ANGELO VANHONI: Vou dar três exemplos. Em primeiro lugar na extensão da educação integral. Nós temos no Brasil, hoje, perto de 35 milhões de crianças até a oitava série e uma cobertura de perto de dois milhões de crianças em educação integral. É menos de 10% da educação integral no Brasil, e ainda não é uma educação integral com carga horária plena, diferente de países avançados como Portugal, Noruega, Espanha, Dinamarca, Inglaterra, França, onde as crianças entram na escola sete/oito horas da manhã e saem às cinco horas da tarde. No Brasil, a educação integral precisa ser consolidada. O Plano Nacional de Educação, se colocado em vigor para os próximos dez anos, prevê 25% das crianças em idade escolar na educação básica, com grade curricular com o tempo necessário para que os conteúdos sejam adquiridos e consolidados no processo de aprendizagem educacional.
Outro ponto que o Plano Nacional prevê muda estruturalmente a educação. É o ensino profissionalizante. Os jovens, de 14 a 17 anos, 70% não concluem o ensino médio em idade escolar correta no Brasil. Com a vigência do Plano Nacional e com o cumprimento das suas metas, nós vamos fazer uma transformação no ensino médio brasileiro. Vamos garantir acesso ao ensino profissionalizante, o que garante uma perspectiva e sentido para essa etapa da vida educacional dos nossos jovens. Hoje o jovem já está sendo chamado aos 14/15 anos para a vida. O Plano Nacional de Educação prevê que quase 30% dos jovens, em idade escolar de 14 a 17 anos, sejam absorvidos pelo sistema nacional de ensino profissionalizante brasileiro, constituído de várias redes, tanto estadual, municipal e federal.
O terceiro elemento prevê a valorização do magistério. Não é possível um professor, que apontamos como uma das profissões mais importantes na estruturação da nossa sociedade, não tenha os vencimentos de início de carreira equivalentes aos profissionais de outras áreas de formação superior. É preciso que a nação faça um esforço pela revalorização da função do magistério em todo território nacional. O Plano Nacional prevê quase 1% do PIB (Produto Interno Bruto) dedicado para essa política de valorização. Não é possível garantir educação nacional de qualidade onde profissionais dos estados da nação, como das regiões Norte e Nordeste e interior do Rio de Janeiro, ganham salário mínimo enquanto tem a responsabilidade de formar futuras gerações do nosso país.
UMBRASIL: Se o Poder Executivo vier a descumprir a regra e aplicação dos 10% do PIB em educação, qual será a reação do Congresso Nacional, considerando o fato de que sua maioria é governista?
ANGELO VANHONI: Daqui a dez anos não sabemos se a maioria será governista porque teremos, no mínimo, duas eleições pela frente. Existe uma norma no Plano. A cada quatro anos será realizada uma avaliação do cumprimento das metas e da aplicação dos recursos. Duas grandes conferências nacionais com a participação da Câmara dos Deputados, Senado Federal e Ministério da Educação, junto com as entidades da sociedade brasileira, que contempla entidades da sociedade civil, iniciativa privada, instituições filantrópicas, escolas públicas, universidades, estudantes, professores e trabalhadores de forma geração da educação.
Não é apenas os 10%, deve haver sempre no juízo do parlamentar, promotor e gestor público o cumprimento das metas articuladas com a meta financeira, porque eu posso cumprir as metas com menos recurso. Se eu for um bom gestor eu posso alfabetizar mais crianças, num curto espaço de tempo, sem necessitar dos recursos que outra cidade precisa. Cada região, cada situação poderá apresentar um diagnóstico. Então, o estado da nação poderá alcançar os números de alfabetização de jovens e adultos, terminar o processo de alfabetização de suas crianças em cinco ou seis anos e utilizar muito menos recursos do que está previsto no plano e cumprir a meta.
UMBRASIL: Em 2003, apenas 3,5% do PIB eram direcionados à Educação, hoje, quase dez anos depois, passou para os atuais 5,1%. Como este investimento de 10% possibilitará ao país um salto de qualidade, uma vez que há um déficit educacional grande no Brasil?
ANGELO VANHONI: Analisando os índices que espelham a qualidade da educação no nosso país, tanto o Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Alunos) quanto às avaliações do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), mostram que o Brasil sabe fazer educação de qualidade. Nas escolas técnicas e Institutos Técnicos Federais, por exemplo, a nota alcançada é de 8 a 8,5. As notas são iguais as da Alemanha, que tem a mesma qualidade da educação tecnológica europeia. Isto demonstra que o nível de aprendizagem brasileiro é de excelência. Nós não temos, ainda, condições de fazer a escala nacional do Brasil, porque nesses últimos anos os investimentos no processo educacional sempre estiveram muito distantes da necessidade do país.
A aprovação de um plano com metas claras e objetivas, que a sociedade tenha condições de compreender quantas crianças devem estar na escola na educação infantil, quantas escolas técnicas temos que ter, como deverá ser a formação dos professores e qual o salário eles devem minimamente receber para que tenha um padrão de qualidade, quanto de educação integral o Brasil precisa ter nos próximos dez anos para melhorar a sua educação e a estipulação do índice de 10%, que garante dobrar os investimentos para a realização dessas metas, com isso, eu não tenho dúvida, nos vamos viver uma outra realidade na hora que o plano for aprovado.
UMBRASIL: Experiências internacionais mostram que para avançar na educação é preciso dedicar 10% do PIB à Educação durante pelo menos 10 anos. O Brasil tem metas de desenvolvimento econômico e social para se consolidar como a quinta potência do mundo. A proposta de aplicação dos 10% do PIB em educação é viável ao Brasil?
ANGELO VANHONHI: Para nós não é suficiente, mas os 10% já são recursos fantásticos que darão conta para que o Brasil faça uma revolução na área educacional brasileira. E sempre, de forma definitiva, para o futuro da nação, na construção do conhecimento de uma maneira ampla, democrática, como principal fundamento para o desenvolvimento do país.
UMBRASIL: Qual o cenário que este investimento trará para a Educação Nacional? E quais serão as expectativas de colaboração com a rede de educação privada?
ANGELO VANHONI: As expectativas são as melhores. No mundo, se vive um processo de crise econômica. Nos últimos dez, quinze anos aconteceram crises, sobretudo, em países como Japão, Estados Unidos e Alemanha. A Europa está consolidada na crise, o Japão começa a se reerguer. Brasil, Rússia, Índia e China entram no ciclo de desenvolvimento econômico. Cada vez mais fica perceptível para a sociedade brasileira, para as pessoas que estão conversando na fábrica, na padaria, no cabeleireiro, uma dona de casa conversando com seus filhos. Fica mais clara a importância para a nação de que a Educação deve ser prioridade nacional. Sempre damos o exemplo mais recente da Coreia que durante dez anos investiu mais de 10% do PIB na educação e conseguiu mudar o processo produtivo e educacional do país. O Brasil precisa desse desafio nesse momento da sua história.
O governo federal tem tido a saberia de dialogar com as redes privadas e filantrópicas do nosso país porque entende a importância complementar que elas têm na construção do sistema público de educação em todo território nacional. Os exemplos estão no ensino superior, da boa qualidade da educação no ensino médio, das escolas infantis, que são sempre de excelência do ponto de vista de técnicas de aprendizagem e de qualidade educacional. O PNE afirma essa importância, a rede particular no país tem papel importantíssimo para que o Brasil seja um país com nível educacional cada vez melhor.
UMBRASIL: A Estratégia 6.5 do PL, para a Educação Integral, prevê considerar as atividades de CONTRATURNO ESCOLAR, como integrante da educação Básica e ou Profissionalizante de forma concomitante, e que podem ser realizadas na rede pública, em parceria com as entidades sem fins lucrativos, que possuem o Certificado de Entidade Beneficente (CEBAS). Sem esta parceria seria possível viabilizar as METAS DO PNE?
ANGELO VANHONI: Possível é, mas é bom que haja a parceria, por isso ficou definido como estratégia. Eu volto afirmar, a partir do caminho que outras sociedades desenvolvidas consolidaram no processo educacional, que a jornada educacional não é de quatro/cinco horas. A jornada é de, no mínimo, seis horas. Isso para você organizar a grade curricular, desenvolver técnicas de aprendizagem, fazer com que as crianças possam vivenciar desde cedo a sua cidade e cultura, tenham experiência com a arte. É um conjunto de atividades que devem fazer parte do currículo no atual estágio que está a educação brasileira. Com uma grade curricular de apenas meio período nós não temos condições de avançar.
Por isso, cada prefeito quando entende a necessidade da educação para consolidar o futuro ele começa avançar na escola integral com recursos próprios. Se olharmos os índices educacionais publicados recentemente vamos perceber que das dez escolas públicas brasileiras, que tiveram a melhor nota no Ideb, seis delas tem educação em período integral. Então a parceria que cada rede municipal faz com as instituições que não fazem parte da rede pública para consolidar os contra turnos e a educação integral é muito importante para o cumprimento desta meta.
UMBRASIL: O PNE 2011-2020 contempla as resoluções da Conferência Nacional da Educação 2010? Quais as sinergias entre as propostas da Conferência e o PNE 2011-2020? Neste sentido, qual a relação efetiva entre participação democrática na construção das políticas públicas e os resultados práticos aferidos neste processo?
ANGELO VANHONI: A sinergia ela é total. A participação da sociedade no processo das conferências municipais e depois estaduais e a nacional, elencou os principais princípios e metas. O poder executivo (Ministério da Educação) copilou as principais estratégias de uma forma didática e consolidou as 20 metas e as diversas estratégias e enviou-as para o Congresso Nacional. O texto que veio do Congresso Nacional é fruto direto da articulação e do atual estágio de desenvolvimento dos trabalhadores da educação e da participação das entidades no processo de construção da Conferência de 2010. As metas que estão colocadas no plano de universalização da educação infantil, são exemplos práticos, essa é uma meta da sociedade brasileira de dez anos atrás que foi consolidada na Conferência de 2010. A meta de universalização de no mínimo 50% das crianças de zero a três anos na educação básica foi consolidada na Conferência de 2010, e está expressa no Plano Nacional. A meta do ensino profissionalizante também. A erradicação do analfabetismo é outra meta da sociedade prevista no plano anterior consolidada na Conferência de 2010.
O poder executivo teve o mérito de transformar um conjunto de metas maiores em 20 metas e um conjunto maior de estratégias em 180 estratégias para que os gestores municipais, estaduais e a sociedade civil, as entidades que representam os setores educacionais brasileiros pudessem visualizar com muita clareza qual é o compromisso que estamos assumindo com a nação nos próximos dez anos. Por isso que o Plano Nacional de Educação se estruturou desta forma: com 20 metas, 12 diretrizes e várias estratégias.
UMBRASIL: Considerando a sua experiência e o seu conhecimento sobre Educação, o que o Sr. considera significativo, relevante, importante para se fazer educação com qualidade?
ANGELO VANHONI: Para termos uma educação de qualidade a escola precisa de boa estrutura, com condições para receber as crianças. Ter carteira, quadro negro, boas bibliotecas, todos os equipamentos necessário para uma boa educação, com tecnologia, fibra ótica, computadores. Os jovens de hoje estão se comunicando e os instrumentos digitais já fazem parte do processo educacional de todas as crianças em muitos países desenvolvidos e, no Brasil, nós precisamos incorporar e estamos incorporando.
Os professores e as equipes pedagógicas precisam ter estrutura de apoio e formação continuada durante o ano inteiro, porque o conhecimento e as técnicas de aprendizagem mudam. Os professores precisam ser permanentemente atualizados. Os governos estaduais e municipais têm que estar articulados para desenvolver o aperfeiçoamento profissional. Sobretudo, eu diria que duas coisas mudariam a escola e traria qualidade para a educação: a escola em tempo integral e a valorização do professor.
UMBRASIL: No ano de 2012, o Sr. fez uma homenagem ao Dia do Marista. Fale um pouco da sua relação com os Maristas.
ANGELO VANHONI: Eu tenho uma relação afetiva com os Maristas. Estudei em duas escolas de formação cristã católica, na Universidade dos Maristas e no ensino médio em um colégio Franciscano. A experiência me traz grandes lembranças da educação que recebi. O papel que os Maristas têm na formação do ensino superior e médio em todo território nacional é elogiável, afinal, eles têm a vocação para isso.
Tem uma universidade no estado do Paraná, a PUC (Pontifícia Universidade Católica) que é, para nós, motivo de muito orgulho porque contribui com o desenvolvimento do nosso estado há muitos anos. Ainda precisamos avançar no Congresso (Nacional) no reconhecimento das entidades filantrópicas na área da educação. Conquistar algumas leis que podem ajudar e muito às escolas com o perfil das PUCs e produzir mais conhecimento para a nação.
Por Chirliana Souza
Analista de Comunicação da Província Marista Brasil Centro-Norte (PMBCN)



